Contribuidores

sexta-feira, 27 de junho de 2008


Não quero brincar mais, por isso, não o faças. Não me limites os desencontros, não me simules as vontades e não me confrontes o prolongamento das minhas próprias fronteiras. Não me troques por tentativas fúteis e estratégias indisciplinadas e desleais, não me situes entre gestos perdidos, não me pressintas a insegurança, não me enroles nos teus escândalos, não me traves batalhas. Não me vistas as palavras, não me dispas a concentração e não te ponhas a meio termo no meu vestido. Não me devores a língua, não me puxes para ti, não me acendas o controlo e não me deixes a boca aberta, que por ela dispara o coração, aflito. Não faças bluff, que toda eu sou all in: mais do que um jogo de póquer que te prende a masculidade débil no botão das calças, não me baralhes a fraqueza; não me dês espadas, dá-me copas. Não me atrapalhes nos actos, porque não, não quero brincar mais. Não me corras entre o sangue apressado, não me pintes a pele amena, não me construas legos perpendicularmente paralelos ao teu caminho, no qual enterras os baús da infância, pequena e inútil. Não me rendas as estrelas, não me embales a escuridão, não me desfiles a tristeza, não me persigas a sombra agitada, não me abandones o chão trémulo, não me trepes os sentidos, não me roubes a razão, não me espreguiçes as frases. Não faças contas de cabeça, não fingas que conheces cada pedaçinho de mim, não me atires às cegas, juízinho, e não brinques mais comigo; não digas que me amas, por favor, não soletres a palavra como quem conta até vinte e aqui vou eu. Vá lá, estou cansada e não me aptece brincar mais. Não? E um cigarrinho na bancada, posso?

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Eterno super-homem


E era sempre quando subia a rampa a correr, cheia de laçarotes que me percorriam todo o corpo e a alma pequenina repleta de uma ingenuidade infantil, que o via. Sentado naquela sua cadeira de eleição, de ferro pintada a branco e com a almofada verde no assento, que ainda é, a trabalhar sempre em qualquer coisa ou simplesmente a descansar da longa caminhada que não se cansava de fazer todos os dias (maldita!).
Foi assim, durante quase 14 anos que, alegremente corria para os seus braços e gritava "AVÔ, cheguei!" e me respondia sempre da forma mais calorosa de que era capaz: com inúmeros beijinhos em cada face da minha cara e com a tão conhecida resposta "Que bom, neta!"; Mais difícil que não me lembrar, é esquecer... De como ficava amuado quando, mesmo sem querer, fazia "asneira". Qual era o mal de entornar um copo de vinho na toalha da avó? A verdade é que, desde muito nova, me fez notar que era possuídor de uma perfeição perfeita em que nada poderia ser feito de forma incorrecta, em que os outros eram sempre os mais importantes e o que vinha para si podia ser sempre a coisa "mais reles" à face da Terra;
Realmente, são mesmo as pequenas coisas que nos tornam grandes e, é por isso, que o avô é a melhor pessoa que conheço. Porque, desde o deixar as boinas no cabide por ordem de utilidade até à organização do vinho na garrafeira e a hora que dedicava à sesta, é especial. E será sempre...
É estranho mas, ainda o sinto quando acendo a luz do lagar para ir lá acima aos tios e passo pelo seu "refúgio". Parece que, às vezes, quando olho lá para dentro, ainda o vejo atarefado a arrumar tudo o que para mim nunca estava desarrumado mas ao que o avô não se cansava de dedicar o seu tempo. Nessas alturas, o nó dá-se na garganta, os arrepios são múltiplos e as mãos ficam húmidas assim como os olhos. E o coração... esse está cheio de memórias preenchidas pelos chocolates que me dava antes do lanche, sem a avó saber. Mas, a verdade é que não está lá...e aí, a saudade permanece e faz esboçar inúmeros sorrisos que me consomem dos pés à cabeça; Quando vou para o largo e passo pelo banco, é impossível reter o olhar para o lado esquerdo visto que as suas tardes eram ali e quando lá passava, chamava-me sempre para lhe ir dar um beijinho. Também já alguns dos seus amigos abandonaram aquele local e até se calhar estão hoje aí, nesse sítio, todos reunidos a festejar, consigo, com água pé e com longos jogos de cartas. Porque hoje está de parabéns. E estará para o resto da minha vida assim como o orgulho de, entre tantas outras coisas, me ter ensinado a jogar à bisca.


Seguidores